A presidente Dilma Rousseff concedeu
nesta quinta-feira (24) entrevista de quase duas horas à imprensa
estrangeira, na qual denunciou “golpe” em curso no Brasil. A ação faz
parte da tentativa de buscar apoio internacional contra seu afastamento.
Dilma avalia que seu processo de
impeachment tem “vácuo de fundamentos legais”. De acordo com o “The
Guardian”, ela denunciou o que entende por “métodos fascistas” usados
por parte de seus oponentes políticos. “Nunca vimos tanta intolerância
no Brasil”, lamentou a presidente. “Não estou comparando o golpe de
agora com o golpe dos militares [de 1964], mas de todo modo poderá
quebrar a ordem democrática do país. E isso terá consequência. Talvez
não imediatamente, mas será uma cicatriz na vida política nacional”,
prosseguiu.
Na sequência, informa o “The New York
Times”, a mandatária atacou Eduardo Cunha (PMDB-RJ), dizendo que o
presidente da Câmara dos Deputados pôs a votação de afastamento em pauta
para encobrir seus próprios problemas com a Justiça. E acrescentou:
“por que eles querem que eu renuncie? Pensam que sou uma mulher fraca?
Não sou”, argumentou. “Querem evitar a dificuldade de retirar,
ilegalmente e criminosamente, a legitimidade de uma presidente eleita”.
Dilma voltou a afirmar que não pedirá
renúncia e prometeu “apelar com todas as armas legais disponíveis”, se o
Congresso votar a favor do impeachment. “Não vou dizer que é agradável
ser vaiada [em protestos], mas não sou uma pessoa depressiva. Durmo bem à
noite”. Segundo ela, a oposição tem dificuldade em reconhecer a derrota
nas eleições de 2014 e age pelo “quanto pior, melhor”, boicotando
agenda legislaltiva proposta pelo governo, o que “afundou o país”.
Rousseff também defendeu a nomeação de
Luiz Inácio Lula da Silva para ministro chefe da Casa Civil, ao
ressaltar que o talento do ex-presidente para a negociação política é
fundamental para o momento de crise, e rechaçou o argumento de que Lula
estaria buscando amparo legal com foro privilegiado. “Estando no
governo, ele responderia à maior Corte do país [Superior Tribunal
Federal]. O STF não é bom o suficiente para julga-lo?”
Ela crê, no entanto, que se manterá
firme no cargo, e o Brasil estará em paz durante os Jogos Olímpicos de
206, no Rio de Janeiro.
Os jornais convidados foram “Le Monde”
(França), “The Guardian” (Reino Unido), “The New York Times” (EUA), “El
País” (Espanha), “Pagina 12” (Argentina) e “Die Zeit” (Alemanha).
Vale lembrar que alguns destes veículos
já se manifestaram sobre a crise política do Brasil. Em editoriais
recentes, o “The Guardian” sugeriu como saída positiva a renúncia da
presidente, e o “The New York Times” classificou como “ridícula” a
nomeação de Luiz Inácio Lula da Silva à Casa Civil. Outro veículo a se
posicionar foi a revista britânica “The Economist”, que publicou
editorial intitulado “É hora de ir”, no qual indica caminhos para saída
de Dilma do poder.
Dilma adotou postura combativa
recentemente. Na terça-feira (22), disse em Brasília que não renunciará
ao cargo e que o processo de impeachment em curso no Congresso é uma
tentativa de golpe, porque não foi cometido crime de responsabilidade.
“Não cabem meias palavras. O que está em curso é um golpe contra a
democracia. Eu jamais renunciarei.”
A mandatária disse que a tentativa de
derrubá-la é tramada nos “porões da baixa política”. “Eu preferia não
viver esse momento, mas que fique claro que me sobram energia,
disposição e respeito à democracia para enfrentar a conjuração que
ameaça a estabilidade democrática do país.”
As afirmações foram feitas em discurso
no Palácio do Planalto, em Brasília, durante encontro com juristas que
criticaram o processo de impeachment e a divulgação de gravações
telefônicas da presidente interceptadas pela operação Lava Jato.
Ainda nesta semana, os ministros Jaques
Wagner (Gabinete da Presidência) e José Eduardo Cardozo (Advocacia-Geral
da União) utilizaram o mesmo expediente. À mídia internacional, Wagner
disse que um possível impeachment acirrará a crise econômica, e não a
contornará.
Apoio internacional
Ao longo da última semana, líderes de
outros países, especialmente os latino-americanos, posicionaram-se a
favor da continuidade do mandado de Dilma. Evo Morales afirmou, em ato
público, que “a direita no Brasil quer voltar, mediante um golpe do
Congresso e um golpe judicial, para castigar o Partido dos
Trabalhadores, o partido do companheiro Lula, para derrubar e processar a
companheira Dilma”.
Rafael Corrêa, chefe de Estado do
Equador, seguiu a mesma linha: “Já não se precisa mais de ditaduras
militares, de juízes submissos, de uma imprensa corrupta, que inclusive
se atreve a publicar conversas privadas, o que é absolutamente ilegal”,
disse, em entrevista à TV estatal do país. Tom parecido com o adotado
por Nicolás Maduro, presidente da Venezuela: “Há golpe de estado
midiático e judicial contra Dilma Rousseff e Lula, líder da nossa
América”, avaliou, em discurso no Palácio de Miraflores, em Caracas.
Já Barack Obama, presidente dos Estados
Unidos, durante visita à Argentina, na última quarta-feira, preferiu não
emitir opiniões sobre a crise política brasileira, e limitou-se a dizer
que “o Brasil é um país grande, é amigo dos nossos países. A boa
notícia é que a democracia brasileira está madura, as leis e as
instituições são fortes o suficiente para que isso seja resolvido de
maneira que o Brasil prospere e seja o líder mundial que é”.
UOL
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